“O amadurecimento do Ministério Público é uma tendência natural”.

Ao longo de seus dois mandatos, Alexandre Magno Benites de Lacerda enfrentou desafios e promoveu iniciativas significativas – Foto Divulgação

Nesta entrevista, temos a oportunidade de ouvir Alexandre Magno Benites de Lacerda, o Procurador-Geral de Justiça de Mato Grosso do Sul, líder do Ministério Público local. Após assumir o comando da instituição no início de 2020, seu mandato foi renovado em 2022 e, agora, chega ao fim neste primeiro semestre.

Ao longo de seus dois mandatos, Lacerda enfrentou desafios e promoveu iniciativas significativas. A principal delas, que ele mesmo coloca como uma das principais metas alcançadas, foi a de construir pontes com instituições e também com a sociedade.

Para ele, o MPMS hoje é muito mais maduro que outrora e perdeu o perfil demandista, ingressando com ações judiciais apenas em casos graves. Nesta conversa franca e elucidativa, o procurador-geral compartilha sua visão sobre o diálogo com a sociedade, a resolutividade das demandas, a defesa dos direitos difusos e coletivos e o papel da instituição no amadurecimento do sistema jurídico brasileiro.

Quando o senhor assumiu a Procuradoria-Geral de Justiça no primeiro mandato, o propósito era aumentar o diálogo do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) com vários setores da sociedade. Acredita que essa meta foi cumprida?

Tenho certeza que sim. Todavia, como em tudo na vida, é necessário evoluir sempre. O papel do Ministério Público (MP) é servir à sociedade, protegê-la e defendê-la, até mesmo contra qualquer erro, falha, excesso ou abuso de seus agentes. Portanto, este papel do Ministério Público deve ser auscultado pela sociedade em seus diversos segmentos e áreas de atuação. O Ministério Público deve buscar sua melhor comunicação com veículos de comunicação sérios, como o próprio Correio do Estado, além de buscar, por meio da Ouvidoria, de seu site, tecnologia e eventos, ouvir a sociedade para que possamos melhor servi-la.

O senhor gostaria de destacar quais outros pontos positivos de sua gestão no MPMS?

A minha gestão pode ser marcada por três pilares. O primeiro deles foi o de avançar no princípio constitucional da unidade institucional. E, para o cumprimento deste primeiro objetivo, a pandemia foi nossa grande escola. O Ministério Público conseguiu, por meio de seus 219 membros, procuradores e promotores de Justiça, trabalhar com unidade.

Naquele momento, em que eu havia acabado de tomar posse para meu primeiro mandato como procurador-geral de Justiça, era fundamental que os promotores de Justiça de todo o estado de Mato Grosso do Sul, com os procuradores, tivessem um maior diálogo e interlocução para a constituição de demandas e a atuação funcional.

Ainda sobre a unidade institucional, costumo lembrar de uma frase, que é um chavão e muito dita por aí: “o crime é organizado”. Digo que o Estado tem de ser muito mais organizado para que possa combatê-lo. Por isso, o papel do Ministério Público, por meio da unidade institucional, tem hoje uma grande marca.

Quais são os outros dois pilares?

Outro pilar fundamental é a resolutividade. Deixamos de ser aquele MPMS demandista, aquele que instaurava um inquérito, requisitava documentos e entrava com uma ação judicial. A judicialização, para nós, para o atual Ministério Público, é uma ação excepcional.

A prioridade para nós é a negociação, o diálogo, a construção de pontes com todos os setores da sociedade, com órgãos e os Poderes Constituídos, não só aqui em Mato Grosso do Sul, mas em âmbito brasileiro. Por meio da resolutividade, nós conseguimos construir resultados efetivos e, hoje, é mensurar como o Ministério Público mudou como é percebido pela sociedade sul-mato-grossense nas mais diversas áreas: no combate ao crime organizado, na defesa do meio ambiente, no combate à corrupção, nas parcerias na defesa da saúde, da educação e dos idosos e contra a violação de direitos das minorias.

O terceiro pilar é que, por meio de projetos exitosos, conseguimos ser altamente condecorados, porque trouxemos ideias inovadoras de avanço, especialmente na tecnologia, como, por exemplo, a inteligência artificial. Com isso, conseguimos baratear o custo do Ministério Público, fazendo que a instituição fosse mais rápida e mais efetiva e, ao mesmo tempo, conseguimos trazer ideias inovadoras que serviram para todo os MPs do País e ajudaram a sociedade brasileira como um todo. Temos um Ministério Público proativo, resolutivo e coeso, por meio da unidade, e, ao mesmo tempo, uma instituição que constrói soluções não só para Mato Grosso do Sul, mas para todo o Brasil, com o diálogo franco e aberto com todas instituições e Poderes.

Os direitos difusos e coletivos estarão cada vez mais na pauta do Ministério Público? É uma tendência?

Com certeza absoluta. Porque a Constituição deu esse papel de guardião da sociedade sul-mato-grossense e brasileira ao Ministério Público. Então, nossa instituição não apenas combate o crime organizado e toda forma de violência, ela combate a corrupção, por meio da defesa do patrimônio público, e defende o idoso, a infância e o meio ambiente.

O meio ambiente, é bom destacar, é algo necessário para a nossa sobrevivência como espécie humana e, de certa forma, é preciso cultivar o amor e o respeito a este planeta. A Terra merece a nossa proteção, precisamos preservá-la para as futuras gerações. Então, esse é Ministério Público do futuro, cada vez mais na defesa de direitos difusos e coletivos.

Você acredita que, nacionalmente, o Ministério Público no Brasil está vivendo uma fase de amadurecimento após a Constituição de 1988, sendo mais resolutivo e fazendo mais acordos, tendo uma atuação mais preventiva, do que simplesmente se ocupando apenas da denúncia em uma ação penal ou civil?

É uma tendência natural e necessária o amadurecimento do Ministério Público. De fato, com a Constituição de 1988, foi feita uma nova instituição. Não tem como dizer que ela é igual à de antes de 1988. Vieram responsabilidades e deveres para o Ministério Público brasileiro, e por óbvio, erros foram cometidos – reconhecemos isso.

Há uma atuação diferente hoje no Ministério Público brasileiro, mais preventiva. Vou te dar um exemplo: sou coordenador do Grupo Nacional de Defesa do Patrimônio Público e posso dizer que o combate à corrupção e aos crimes eleitorais vem sendo construído por meio da responsabilidade, e sempre há uma busca efetiva pela resolutividade dos problemas. As pequenas demandas são tratadas como pequenas e são negociadas e resolvidas.

A orientação é deixar para levar para o Poder Judiciário tão somente os casos graves, casos que de fato exigem atuação enérgica, como casos de corrupção, de lavagem de dinheiro, de crimes eleitorais graves ou de violação ao meio ambiente. Esses, sim, merecem atuações mais incisivas, como ações judicializadas para esses casos mais graves. Então, o papel do MP é trazer rapidamente uma solução para a sociedade.

Recentemente, houve um acordo homologado para a ocupação e preservação do Parque dos Poderes. Gostaria que comentasse sobre esse acordo. Em sua opinião, ele foi positivo para a região e seu entorno?

Por óbvio, o Ministério Público tem a missão constitucional e legal de proteger o meio ambiente. Todavia, nós acreditamos que a defesa do meio ambiente tem de ser compatibilizada com o desenvolvimento econômico sustentável e, ao mesmo, com uma proteção de um patrimônio. No caso, um patrimônio que foi um grande presente do governo Pedro Pedrossian – aliás, um homem visionário – para todo o estado de Mato Grosso do Sul, que é o Parque dos Poderes.

A questão do meio ambiente não pode ser estanque, isolada. Ela tem de ter toda uma continuidade lógica, sistêmica, de proteção de florestas e árvores. É lógico que não queremos nenhuma violação ao meio ambiente. Mas em uma área, há seus limites estabelecidos para preservação permanente, reserva legal e também para áreas em que a expansão é permitida.

Por isso, nesse acordo, o Ministério Público foi sim favorável à homologação, porque conseguimos fazer com que o governo do Estado – a quem eu parabenizo – retrocedesse a ideia de retirar uma grande área de mata que separa o Parque dos Poderes do Jardim Veraneio. Trata-se de uma área sensível do parque e que a legislação atual permite que ela seja desmatada. Contudo, com o acordo, ela permanecerá como está.

Há mecanismos em que se possa fazer a ocupação do Parque dos Poderes, porém, ao mesmo tempo, protegendo o meio ambiente. E foi nesse espírito de bom senso, de equilíbrio de forças e de proteção de um desenvolvimento sustentável que o Ministério Público apoiou esse acordo. Tenho certeza que é uma evolução para o Jardim Veraneio, um bairro ao lado que tende a ser povoado.

Por isso, tenho a absoluta certeza de que, com essa proteção dessa faixa de mata, fechamos um círculo no Parque dos Poderes, criamos um corredor ecológico, um círculo de proteção ambiental das flores. Dessa forma, conseguiremos com certeza evoluir e melhorar a ocupação do parque.

Perfil

Alexandre Magno Benites de Lacerda

Promotor de Justiça no MPMS desde maio de 2004. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).

Mestre em Processo Penal e Garantismo pela Universitat de Girona (UdG). Atualmente, ocupa o cargo de procurador-geral de Justiça do MPMS, biênio 2020-2022 e reeleito para o biênio 2022-2024.

Vice-presidente pelo Centro-Oeste do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União. Vice-presidente do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC).

 

Fonte CE.

Redação Gdsnews.

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