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Trator contra o crime: PM ganha nova ‘tropa de elite’ para destruir barricadas em ruas do Rio

Na estimativa da corporação, de janeiro a agosto foram recolhidas 10 toneladas de material de barricadas de favelas da Região Metropolitana, o que corresponde a 95% de todas as barreiras removidas no estado.

Jorge Antônio Oliveira buscava um emprego estável no serviço público. Em 2000, ao ingressar na Polícia Militar, e durante o curso de formação de soldados, teve a atenção despertada pelo trabalho do Batalhão de Operações Especiais (Bope). Na época, a unidade, em expansão, precisava de voluntários, e ele entrou para a tropa de elite. Jorge tem habilitação série D, para dirigir veículos pesados, e ganhou a missão de pilotar o trailer preto da unidade de intervenção tática, de gerenciamento de crises com resgate de reféns. Três anos depois, o recrudescimento da violência no estado levou o Bope a adquirir blindados, os “caveirões”. Jorge passou a ser o “01 do blindado”. E, agora, tornou-se o “01 da retroescavadeira”: é instrutor e atua na retirada de barricadas instaladas por tráfico e milícias em áreas do estado.

‘Kits demolição’

O Bope faz uso da retroescavadeira desde 2007, época da criação da Unidade de Engenharia de Demolição e Transporte do batalhão, mas o comando da Polícia Militar acaba de comprar cinco “kits demolição”, conjuntos formados por uma retroescavadeira, um veículo-prancha de transporte do maquinário e um caminhão basculante, para a retirada do entulho. O investimento da Secretaria de Estado da Polícia Militar foi de R$ 11 milhões, provenientes do estado e da União. Na estimativa da corporação, de janeiro a agosto foram recolhidas 10 toneladas de material de barricadas de favelas da Região Metropolitana, o que corresponde a 95% de todas as barreiras removidas no estado.

Para o serviço específico de demolição de barreiras, a PM criou o Núcleo de Apoio às Operações Especiais (Naoe), responsável por maquinário e treinamento dos policias na nova função. Os “kits” serão usados principalmente na capital, na Baixada Fluminense e em São Gonçalo. O Naoe é subordinado ao Comando de Operações Especiais (COE): os operadores só entram em ação depois que o território é estabilizado pelos grupos táticos.

Barricadas em favelas

Barricadas em favelas Barricadas em favelas Foto: Editoria de arte

Professor da nova turma de operadores, Jorge Antônio acumula as aulas com a direção da retroescavadeira. O “01 do blindado” conhece de cor a evolução dos equipamentos de segurança e das dificuldades enfrentadas nas ruas:

— Para impedir a entrada dos blindados, de 2004 para cá, os criminosos usavam óleo nas ruas, e evoluíram para barricadas com carcaças de carro, entulho, geladeiras e tonéis com concreto. Agora, são trilhos fincados em sapatas de grande profundidade e fossos. Inicialmente, empurrávamos com os blindados, mas isso danificava os veículos. Daí a necessidade das retroescavadeiras. Nas favelas íngremes, há uma novidade: imensos portões de puro aço. Mas a gente não desiste — conta Jorge, de 53 anos, 22 como “caveira”.

‘Kits demolição’

Um estudo da Subsecretaria de Inteligência da PM, iniciado em janeiro deste ano em três grandes favelas do Rio, revelou o número de barricadas e a sofisticação em sua montagem. Foram examinadas as características do Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo; do Jacarezinho e do Complexo do Alemão (Ramos), na capital. Quanto mais plana é a área, mais barricadas, constatou a pesquisa. Apesar de haver menos barreiras nas regiões mais íngremes, policiais que, como Jorge Oliveira, atuam na demolição dos obstáculos, já perceberam que as instalações nessas comunidades são feitas por pedreiros, soldadores e ferreiros com experiência em grandes construções.

‘Kits demolição’‘Kits demolição’ Foto: Editoria de arte

Levantamento da PM, baseado em imagens feitas por drone ou por filmagens e fotos produzidas durante as operações, listou 209 barricadas no Salgueiro, 60 no Jacarezinho e 20 no Alemão. Segundo o secretário de Estado da Polícia Militar, coronel Luiz Henrique Marinho Pires, todas as barreiras do Jacarezinho foram removidas nos últimos meses, dentro do programa “Cidade Integrada”, do governo do estado, que prevê obras em seis favelas, classificadas pela polícia sob maior domínio do crime organizado, até o fim do ano.

— A aquisição do kit demolição era necessária. Antigamente, ficávamos restritos às retroescavadeiras do Bope e das prefeituras. Nesse último caso, era muito ruim colocar operários das prefeituras em risco. Nem sempre o equipamento está disponível, além de não ser papel do município — afirma Luiz Henrique.

Enxugando gelo

A sensação, por vezes, parece ser a de que a polícia está enxugando gelo, já que barricadas retiradas num dia costumam ser substituídas na manhã seguinte, mas o secretário defende a ação.

— Além de fazer as operações com inteligência e de forma planejada para evitar riscos, estamos desobstruindo as vias para a comunidade. As barricadas impedem o socorro e a entrada dos serviços públicos. Não podemos permitir áreas fortificadas, guetos. O estado tem que estar e entrar em qualquer lugar. Mesmo que no dia seguinte tenha que voltar lá para retirar uma nova barricada. Se você não enxuga o gelo, as pessoas morrem afogadas — afirma o coronel Pires.

A função de “01 da escavadeira” já trouxe a Jorge Antônio Oliveira momentos de sufoco. Não à toa, é comum ver os operadores nas cabines da retroescavadeira com uma mão no controle da máquina e a outra segurando um fuzil:

— O pior foi na tomada do Alemão, em 2010. Jogaram um artefato no capô do blindado, que pegou fogo. Era muita fumaça. Estouraram cinco dos seis pneus, mas consegui sair de lá. Foi à única vez que pensei que não sairia vivo.

Morador do Alemão, X. é favorável à retirada das barricadas, mas ressalva:

— É ruim não poder tirar o carro da garagem, não ter passagem para ambulância, carro de funerária. Mas também não é bom ver o caveirão entrar e sair levando o que tem pela frente.

 

Fonte O Extra.

Redação Gdsnews.

 

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