Empresários do agronegócio de Mato Grosso do Sul pedem socorro à Justiça

Foto: Arquivo.

O agronegócio é considerado o “motor” da economia de Mato Grosso do Sul, registrando bons números nos últimos anos. Mesmo assim, o segmento demonstra um aumento na quantidade de falências e pedidos de recuperações judiciais. Somente neste ano, quatro produtores ou agroempresas recorreram à Justiça.

De acordo com o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), com dados da Vara de Falências, Recuperações, Insolvências e Cartas Precatórias Cíveis, até maio deste ano, foram contabilizados 31 pedidos de recuperação judicial e 38 processos de falência nos setores empresarial e rural.

Entre os pedidos realizados neste ano por empresas do agronegócio estão o frigorífico Boibras, a AGM Trade Cereais Ltda. e os grupos Maier e Basso, atuantes na agricultura.

O doutor em Economia Michel Constantino avalia que a atividade é natural e ocorre como uma espécie de estratégia para as empresas que passam por algum tipo de crise nas contas. “Serve para poder dar um fôlego, reorganizar as finanças e, assim, poder voltar a funcionar ativamente, gerando lucro”.

Constantino ainda ressalta que as medidas de recuperação judicial ocorrem habitualmente no mundo dos negócios, tendo, no caso do setor rural, as questões climáticas e a instabilidade econômica como agravantes.

“Há empresas que são mais sólidas e têm mais planejamento, enquanto outras são o oposto. Outro ponto é a pandemia, com relação aos custos movimentados nesse período, que contribuíram para desestabilizar os negócios”, enfatiza.

Na esfera jurídica, o secretário-adjunto da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Filipe Denki, salienta que produtores rurais, principalmente do ramo familiar, vivem uma crise econômica que vem desencadeando o aumento do endividamento.

Entre as causas atribuídas à potencial crise indicada pelo advogado estão o aumento dos preços dos insumos agrícolas, o custo do crédito, a redução do preço da soja, do milho e da arroba do boi, o aumento do arrendamento mercantil e a falta de armazéns.

“Entre 2020 e 2022, os preços nominais dos principais fertilizantes tiveram alta de 288%. Insumos como MAP, KCl e ureia aumentaram mais de 140%. No caso dos defensivos, o preço de importação de diversas moléculas, como glifosato, acefato, atrazina e malathion, está mais caro pela falta de suprimentos, com um acréscimo que variou de 13% a 77,1%”, calcula Denki.

Ele ainda enfatiza que, com o aumento nos preços desses insumos, espera-se um maior custo de produção para as indústrias sementeiras, o que está sendo repassado ao agricultor com uma evolução de preços das sementes em torno de 20% a 25%.

EMPRESAS

Ambos os agricultores citados são da região do município de Bela Vista e tiveram o pedido de recuperação judicial deferido. A alegação de perdas financeiras tem como base o baixo rendimento com as safras, motivado por intempéries climáticas, como estiagem e excesso de chuvas, o que gerou dívidas na ordem de R$ 60 milhões.

Conforme informações do processo judicial, a família Maier desempenha atividades agrícolas de grãos há mais de 10 anos, iniciadas no assentamento Itamarati e expandindo para os municípios de Bela Vista, Jardim e Caracol.

Adquirindo dívidas com financiamento de plantio, maquinários e tributos, o grupo detém 22 contratos com credores de bens que pertencem aos devedores, resultando em um montante de R$ 29,7 milhões em pendências.

Já o Grupo Basso, corporação do agronegócio originada em Dourados, ativo desde a década de 1980, ampliou os negócios arrendando terras em Bela Vista, entrou em recuperação judicial sob o argumento de crise também em virtude das questões climáticas que ocasionaram quebra na safra e também a pandemia de Covid-19.

Acumulando deficit de R$ 28,7 milhões, o pedido de recuperação foi acatado pela 3ª Vara Cível e Regional de Falências e Recuperações Judiciais da cidade de Corumbá e, no período de seis meses, determina a suspensão de cobranças ou ações judiciais contra o grupo pelas dívidas, ação que também foi concedida aos Maier.

A AGM Trade Cereais, atuante na comercialização de soja no Estado desde 2004, foi outra agroempresa que solicitou recuperação judicial neste ano. O pedido foi registrado em fevereiro e acatado pela Justiça em março. Os débitos da empresa rural somam R$ 170 milhões.

Como justificativa, a cerealista aponta no pedido à Justiça que as condições estão desfavoráveis para o mercado de grãos e ainda as condições climáticas adversas.

Segundo consta nos autos do processo da requerente, as questões financeiras tiveram início em 2021, quando a situação começou a se agravar, ocasionadas principalmente pela desvalorização no mercado de produtos como soja e milho, da moeda e, ainda, pela escassez de crédito.

Contudo, apesar de estar em pleno funcionamento e contar com um caixa de aproximadamente R$ 25 milhões, a AGM alega que o pagamento das pendências resultaria na pré-falência da empresa.

Com o processo acatado pela Vara de Falência do Estado, a cerealista poderá, no prazo de 180 dias e com possibilidade de prorrogação, seguir com suas atividades em pleno funcionamento, contando com prazos prolongados e descontos, a fim de arcar com as dívidas em aberto.

O frigorífico Boibras Indústria e Comércio de Carnes e Subprodutos Ltda., localizado em São Gabriel do Oeste, recorreu à Justiça recentemente para tentar evitar a falência. Com um pedido de recuperação judicial, o frigorífico conta com uma dívida total em torno R$ 51 milhões, conforme consta na apelação judicial.

Com a justificativa para o recurso, a empresa sustenta uma grave situação financeira e afirma que “vem experimentando dificuldades em adimplir as obrigações trabalhistas, tributárias e com seus fornecedores, além de severa dificuldade financeira, o que confirma sua precária condição econômica”, diz parte do processo.

Ainda em avaliação pela Justiça do Estado, a Boibras pede a suspensão das ações e execuções que correm contra ela pelo prazo de 180 dias.

MEDIDAS JUDICIAIS

O secretário-adjunto da Comissão de Recuperação de Empresas explica que a recuperação judicial é um instrumento pelo qual o produtor rural em crise pode fazer uso para negociar a dívida com os seus credores por meio da participação do Judiciário. Nela, é apresentado pelo devedor aos credores um plano de pagamento da dívida.

“Entre as vantagens da recuperação judicial, podemos destacar o congelamento da dívida até a aprovação do plano de pagamento, carência, desconto/deságio, parcelamento, venda de ativos e tratamento tributário mais benéfico, além do acompanhamento de profissionais que auxiliam na organização da atividade”, ressalta Filipe Denki.

O especialista em Direito Agrário Gabriel do Vale acrescenta que a recuperação judicial e a falência nada mais são do que procedimentos adotados por empresários em momentos de dificuldades financeiras.

“O assunto é muito amplo, mas, em suma, a recuperação judicial é quando a crise é considerada sanável e tem por objetivo viabilizar a superação de crise econômico-financeira da empresa, protegendo seus funcionários, fornecedores, prestadores de serviços e principalmente os clientes, por meio de acordos entre a empresa e os seus credores”, detalha.

Sendo assim, a medida visa proporcionar um ambiente favorável para a negociação entre o devedor e seus credores, estabelecendo-se um período de proteção em que não é possível a penhora de bens e dinheiro e expropriação de bens pertencentes ao produtor rural.

Essa preservação por meio de acordos garante que a empresa continue funcionando normalmente.

“Apenas pessoas jurídicas e produtores que comprovarem a atividade rural podem pedir a recuperação judicial. Caso a empresa não consiga honrar com seus acordos, ocorre o instituto da falência, que é quando a crise é considerada insanável”, conclui do Vale.

 

Fonte CE.

Redação Gdsnews.

 

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